Retrato de Oliveira Martins

, 1891

Columbano Bordalo Pinheiro

Óleo sobre tela

65 × 54 cm
assinado e datado
Inv. 1281
Historial
Adquirido pelo Estado à Sociedade Missionária Portuguesa de Cucujães em 1947.

Exposições
Lisboa, 1894; Porto, 1895, 7; Lisboa, 1904, 58; Lisboa, 1948; Lisboa, 1957, 38; Lisboa, 1980, 26, p.b.; Lisboa, 2007.

Bibliografia
OLIVEIRA, 1894, 230 – 231; MACEDO, 1952, XLIII, p.b.; PAMPLONA, 1954, vol. I; FRANÇA, 1967, vol. II, 265; Columbano, 1980, 33, p.b.; FRANÇA, 1981, 75; Columbano Bordalo Pinheiro, 1874 – 1900, 2007, 151; AZEVEDO, s.d., p.b.
Guiado por um projecto reformista, independente e suprapartidário, Oliveira Martins iniciou em 1878 uma breve e desiludida carreira política, que remataria, um ano depois da grande crise que afectou Portugal – e portanto um ano após a execução deste retrato –, com a efémera passagem pelo Ministério da Fazenda. O contacto com Columbano é propiciado não pela política, mas pela pertença de Oliveira Martins a esse grupo de intelectuais da Geração de 70, com espírito crítico e lucidez para compreender os problemas da vida nacional e procurar através de um ideário regeneracionista uma saída para Portugal. O insucesso do projecto modernizador haveria de juntá-los no grupo jantante Vencidos da Vida, nome sugerido pelo próprio Oliveira Martins, inspirado no comentário de Jules Claretie sobre grupos parisienses similares: “battus de la vie! Eis o que nós somos... Vencidos da Vida. Propusemo-nos dar ao país uma «Vida Nova» e somos afinal de contas uns Vencidos da Vida”.
Columbano realiza este retrato no mesmo ano em que Oliveira Martins publica a obra Os Filhos de D. João I, obra histórica, que mereceu destaque internacional, onde ele retrata alguns portugueses com um papel importante na evolução da história. Ainda nesse ano, apesar do desânimo, não se tinha concretizado o insucesso ou inviabilidade do projecto que o animou e que levaria Raul Brandão, seu companheiro, a atribuir-lhe a morte em 1894 por uma “doença da alma”.
Como já acontecera com Antero de Quental, Columbano a partir desse particular realismo que soube esgrimir, em que a realidade se inventa para mostrar o pessimismo e revolta dos intelectuais, e assim intervir socialmente no seu momento histórico, imprime ao retrato de Oliveira Martins uma carnação espectral que, como no caso citado, será interpretada como premonitória do iminente final do retratado.
Iconograficamente, Columbano repete o esquema compositivo dos outros retratos deste ano e a mesma iluminação, proveniente de um lado, aproxima o perfil do retratado do espectador, condenando à escuridão os pormenores da outra face, cabelos e roupas, pontualmente resgatados nos seus contornos e volumes, por acção de subtis brilhos. Mas o tratamento cromático das carnações é outro. A presença de tons quentes, avermelhados, reduz-se aqui, em especial na zona da testa, mais esbranquiçada, como o cabelo, e o pormenor do desenho que descrevera outras personagens desfaz-se com um leve esfumado, uma pintura de aplicação mais macia, conferindo-lhe um aspecto algo espectral, que o olhar perdido reforça, apesar da serenidade com que é interpretada a personagem. Não é de estranhar o comentário que dele fizera Alberto de Oliveira, quando o viu na exposição individual de 1894 em que, referindo o seu “estado febril, com os olhos a arder”, verá nele a revelação interna do escritor: “como certamente será quando ergue do pó das colónias as almas dos heróis, e a face d’elles ajoelha e se entusiasma”.

Maria Jesús Ávila