As relações entre arte e política são longínquas, quer sob a forma de legitimação ou de contrapoder. Ao longo do século XX, esta relação tornou-se particularmente profícua, desde a propaganda dos totalitarismos, aos movimentos de subversão e rutura como o Dadaísmo, o Surrealismo, ou o Fluxus, às correntes estéticas de denúncia como o Neorrealismo, às expressões artísticas associadas à defesa dos direitos civis e das mulheres nos anos 70, ou ainda à discriminação sexual, exponenciada pelo surgimento da Sida nos anos 80, só para citar alguns exemplos.
Paradoxalmente, estes movimentos de rutura com o sistema foram apropriados pelo mercado da arte, cuja valorização especulativa apoiada por um conjunto de mediadores, munidos de estratégias agressivas, tem dominado a produção artística até à atualidade.
A emergência de novas tipologias associadas aos meios de comunicação de massas, como a fotografia, o vídeo, o cinema, a televisão ou a internet foram determinantes na construção de diferentes linguagens artísticas rompendo com a aura da obra de arte que a distanciava do espectador, tal como previra o filósofo Walter Benjamin. Os museus deixaram de ser só espaços de contemplação e legitimação histórica da obra de arte, tendo-se tornado plataformas ativas de intervenção cultural. Com a democratização dos públicos em detrimento do elitismo cultural, o espectador ganhou um papel mais interventivo.
Em Portugal, no rescaldo da Revolução de Abril, o crítico Ernesto de Sousa, comissário da emblemática exposição Alternativa Zero (1977), denunciava a dificuldade dos portugueses em lidar com a contemporaneidade, reivindicando a necessidade de “clamar por um novo conceito em que a arte seja participação no real, no quotidiano de todos” enquanto o historiador José-Augusto França afirmava, no contexto da mesma exposição, que “a arte é sempre política”.
Na primeira década do século XXI, assiste-se a uma nova intensificação da relação entre arte e política para evocar velhas e novas problemáticas como o pós-colonialismo, as questões de género e de identidade, a injustiça e desagregação social, a especulação financeira, a destruição da paisagem, entre outras.
São estes os temas tratados nesta exposição temporária, num registo criativo, mas também de cidadania, ambicionando agir sobre a realidade, transformando-a, através da provocação, da ironia, do humor, da transgressão, do manifesto, da violência.
Algumas ausências da coleção foram colmatadas com a cedência de obras muito recentes, num diálogo constante e atualizado que o MNAC mantém com os artistas, acompanhando e divulgando a criação contemporânea nacional.
Emília Tavares
Curadora