Pedro Paiva (Lisboa, 1977) e João Maria Gusmão (Lisboa, 1979) expõem conjuntamente desde 2001, uma colaboração que remonta à frequência comum do curso de Pintura da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa e que se tem actualizado através da criação e da produção de peças, curadoria de exposições e autoria de textos teóricos. Recentemente foi-lhes atribuído o Prémio EDP Novos Artistas, que veio chamar a atenção de um público mais alargado para um trabalho que Pedro Lapa, director do Museu do Chiado - MNAC e curador da exposição, considera "surpreendente, maturado e com um discurso próprio muito substancial, mostrando uma flexibilidade no tratamento de vários meios".
A primeira participação comum, uma instalação (sem título, 2001) ocorreu na exposição InMemory, curada por Pedro Paiva e apresentada em 2001 na Galeria Zé dos Bois. No ano seguinte a dupla embarcou no projecto DeParamnésia , concebido e produzido pelos próprios artistas. Um projecto de residência artística num espaço - Tercenas do Marquês (Associação Zé dos Bois) -, efectivado através de um trabalho de reflexão teórica e experimentação formal realizado à porta fechada, intercalado com a apresentação pública de três exposições (DeParamnésia parte 1, 2 e 3), na qual mostraram não só trabalhos seus, mas também trabalhos de artistas como Philippe Meste, João Tabarra ou Alexandre Estrela. Desta forma os dois artistas procuraram uma ampliação dos resultados do projecto de experimentação e reflexão: para além da realização das obras de arte (o resultado mais óbvio), o exercício curatorial de entendimento e convocação da obra de outros artistas.
Intrusão: the Red Square , título da exposição no Museu do Chiado - MNAC, a primeira de João Maria Gusmão e Pedro Paiva num espaço institucional, dissemina-se por vários espaços do museu onde são apresentados vários trabalhos fotográficos (projecção de slides de 60 mm e impressões de grande formato), uma projecção dupla de vídeo e dois filmes de 16 mm.
O trabalho de João Maria Gusmão e Pedro Paiva tem privilegiado uma grande diversidade de media, ainda que o filme e a fotografia sejam recorrentes. As situações construídas com personagens e elementos, que por vezes passam de um trabalho para outro, não propõem uma narrativa que assuma o desenvolvimento de uma situação num transcurso temporal. O humor patenteado por cada uma destas situações intrigantes e inconsequentes advém de um non-sense que afecta os seus trabalhos, marcados pelas coreografias e truques obsoletos dos filmes mudos dos primórdios do cinema. Ao resgatarem esta obsolescência, João Maria Gusmão e Pedro Paiva potenciam possibilidades que vistas de outro tempo são actualizadas pelo seu retorno como selecção. O que pode parecer uma experimentação submetida a uma ordem do entendimento revela-se o acontecer na sua irredutibilidade a qualquer sentido prévio ou consequente. No entanto, para um olhar mais atento, este niilismo não se queda pela sua negatividade, uma transmutação opera-se e a vontade como afirmação torna-se o móbil das acções produzidas por cada um destes trabalhos. Por isso cada um constitui o instante e a sua relação consigo mesmo, que determina a relação com outros instantes e se assume incondicionadamente afirmativo.
Depois de tantos trabalhos de luto dominando até ao limite o contexto artístico, seremos capazes de descobrir no riso e no jogo um acto de vontade e afirmação estética? Para tal nos convidam João Maria Gusmão e Pedro Paiva.
Pedro Lapa