Consequentemente estes géneros são afectados na sua determinação. Uma consideração do intervalo entre a estabilidade que qualquer género assume no seio de um sistema cultural e o devir a que a performance o submete é intensificada nos trabalhos de João Onofre. Um conjunto de jovens modelos a declamar um chavão humanista, um coro tradicional, treinado em música sacra, cantando The Robots dos Kraftwerk ou um par de mágicos fazendo levitação no atelier do artista, não só inscrevem uma ironia relativamente a pretensões históricas precisas, como subvertem os dispositivos dos respectivos géneros. Na sua inabilidade de execução deixam escapar os sinais do que poderíamos designar pelas suas exterioridades. É então na conjugação destes contextos tão diversificados que os vídeos de João Onofre abordam criticamente a relação entre um género e a representação. O esforço manifestado pela incomodidade dos performers inscreve a tensão que une uma ordem à construção de realidade. Por isso, o próprio esforço do acto performativo funciona como a metáfora da coesão e disparidade de elementos que constroem o vídeo. Uma das determinações iniciais do entendimento do vídeo consistiu na sua possibilidade de registo de um acto performativo. É então na devolução dessa dimensão, entendida nas suas possibilidades críticas ao submeter-se a uma das suas ordens discursivas, que os vídeos de João Onofre rearticulam a enunciação dos actos.
Pedro Lapa
Director do Museu do Chiado