Em 1891, pintou o Retrato de Adrien Demont (1851-1928) paisagista sensível de crepúsculos. O retrato impunha-se pelo poder da imagem, sob o efeito de uma amizade e admiração mútuas. Uma pose natural, o gosto de descrição do traje, os pincéis sobre a mesa, intensificavam a sedução do olhar meditativo de poeta-pintor, interessado na luz e tonalidades da cor, como algumas pinturas de Veloso Salgado, Noir et Rose, de 1892, e pinturas simbolistas da década de 1890.
O Retrato de Virginie Demont-Breton (1859-1935) de 1894 revelava uma lutadora, de paleta e pincéis elevados como uma deusa-caçadora. Artista de forte personalidade registava os quotidianos das famílias de pescadores, e a bravura do mar do Norte de França, com um dinamismo semelhante ao da fundação da União das mulheres pintoras e escultoras e de uma Escola aberta a mulheres artistas. A sua pintura inspirou Veloso Salgado em A flor do mar, de 1892, tanto pela temática como pela cor.
Estes retratos de artistas, poderosos em sensibilidade e qualidade técnica, destacam-se pelo seu carácter inédito. A sua expressividade e pintura tonal revelam uma observação psicológica dos retratados e a amizade que os unia, valorizando os seus perfis artísticos como fórmula visual de prestígio social e intelectual. Existe uma importante correspondência, amistosa e profissional, trocada desde 1896, em Lisboa e França, recentemente completada com as cartas de Veloso Salgado para o casal Demont. Por outro lado, a descoberta destes retratos e o envolvimento do autor com Wissant são determinantes para uma inovadora reflexão sobre as obras de Veloso Salgado e o seu percurso artístico.
M.A.S.