Um longo percurso separa o movimento encantatório/público do cinema do diálogo imbuicional/privado do vídeo, mas esta reflexão de Cocteau atravessa o tempo e serve-nos exemplarmente de contexto e ponto de partida para a análise da instalação vídeo de Alexandre Estrela, constituída por três peças autónomas: Cross Sharing, Hi8 e Turquoise Hexagon Sun, projectadas em diálogo permanente.
O trabalho de Alexandre Estrela, reflecte, acima de tudo, uma singular e dupla postura face ao processo criativo, a de um autor em permanente concentração, pesquisando "os encontros fortuitos, a atenção e a desatenção", e a de um espectador maravilhado com os artifícios perceptivos. Contrariando a própria natureza imediata, logo abstraída, dos sinais electrónicos da imagem vídeo e dos mecanismos de apreensão da sociedade contemporânea, segundo a teorização de Walter Benjamin, assentes num "estado de distracção", Alexandre Estrela incute a todo o seu trabalho uma filosofia metódica da concentração pura, de modo a desarticular os enredos da forma de olhar.
Os três vídeos, apresentados no Museu do Chiado, reflectem súmulas do seu percurso criativo e neles reencontramos questões essenciais, resultando numa espécie de evangelho das suas procuras e encontros estéticos.
Emília Tavares