Paralelamente a avenida foi povoada de bares e discotecas tornando-se um lugar de diversão nocturna concorrido e suficientemente maioritário para o estabelecimento de uma indústria de entretenimento. Rapidamente os hábitos do lugar foram transformados pela agitação de centenas de jovens que vagueiam de bar em discoteca até ao encerramento de toda esta panóplia de diversão e consumo. Durante três fins de semana Gillian Wearing decidiu filmar as ruas e os interiores das discotecas da Broad Street, de forma mais ou menos oculta, aproximada ou aproximada pelo zoom da câmara, quase sempre fixa, mantendo, por isso, um afastamento que deixa em aberto o lugar do observador dos múltiplos acontecimentos que vão decorrendo ao longo da noite. A mistura e a montagem destes registos, distribuídos por seis vídeos projectados pelas quatro paredes de uma sala, cercam o observador tornando impossível uma percepção total dessa simultaneidade excessiva de situações, acompanhados pelos seus ruídos e músicas estridentes. As dimensões variadas das projecções nas paredes geram uma proliferação de imagens que no decurso temporal da sua apresentação travam relações entre si, não só pelos pólos de interesse do observador e consequente direcção da atenção, mas também pela aparente sequência de acções ou reconhecimento de um mesmo cenário nas diversas projecções. Assume assim relevância a relação espacial das diferentes projecções que suscita articulações entre si e que o observador realiza através de uma montagem sobre as montagens de cada projecção. O som de cada registo coexiste com os outros, no entanto sofre continuamente enfoques através do volume mais destacado de uma determinada situação. Esta flutuação de enfoques sonoros dos vários registos visuais organiza uma sequência no curso do desenvolvimento temporal da peça. Todavia é também neste decurso que a atenção suscitada pela pluralidade de estímulos tende a dissociar o som da visualidade, já que progressivamente a atenção descola da relação directa de ambos os registos: sonoro e visual. Este facto, gera uma instabilidade provocada pela parcialidade da percepção do observador que sabe sempre que algo mais está a acontecer, embora a tal não possa fisicamente aceder. A multiplicidade de registos descobre-se assim como uma constelação a que escapa qualquer centralidade de um ponto de vista. Produz-se com isso uma imagem composta, possibilitada pela própria instalação.
Perdro Lapa
Director do Museu do Chiado