"O paradoxo fotográfico será então a coexistência de duas mensagens, uma sem código (o aspecto analógico da fotografia), e outra codificada (que seria a "arte'', ou o tratamento, ou a "escrita", ou a retórica da fotografia); estruturalmente o paradoxo não é evidentemente o conluio de uma mensagem denotada com uma mensagem conotada - esse é provavelmente o estatuto fatal de todas as comunicações de massas - mas o facto da mensagem conotada (ou codificada) se desenvolver neste caso a partir de uma mensagem sem código. O paradoxo estrutural coincide com um paradoxo ético: quando se pretende ser “neutro, “objectivo” (...) como pode a fotografia ser "objectiva" e “investida" natural e culturalmente? É apreendendo o modo de imbricação da mensagem denotada e da mensagem conotada que talvez um dia se possa responder a esta questão."'
E de facto muitos artistas, sobretudo a partir da década de 1970, começaram a interrogar o estatuto da imagem fotográfica como um vestígio privilegiado para desenvolver um trabalho crítico sobre esse campo de pressões que organiza o código e lhe confere um valor ideológico aparentemente não declarado. Um trabalho de desconstrução destes procedimentos foi posto em marcha através de múltiplos procedimentos que possibilitaram isolar as unidades significantes ou os valores representados de forma a revelar como essa imbricação se processa e que mecanismos da ordem simbólica actuam.
O trabalho de Rosângela Rennó inscreve-se nesta prática de uma forma absolutamente singular, levando-a a novas considerações jamais abordadas e de vasto alcance nas determinações da própria imagem.
Pedro Lapa
Director do Museu do Chiado