A intenção de reportar uma outra actividade artística não está condicionada à consideração ilusória da fotografia como um análogo denotativo do real, ou seja, como uma mimese isenta e neutra relativamente a qualquer código, mas é por si um trabalho autónomo, com a sua ordem de considerações, afectações e escolhas, que se articulam de fotografia para fotografia. Importa, no entanto, não perder de vista como a encomenda pode confinar a recepção a objectivos determinados, por mais alargados que estes sejam. A escolha de um referente, tema ou modo de apresentação submetidos a uma função determinada são por si instâncias de condicionamento, como muito mais elaborada o pode ser a que sobre algo que procura legitimação apenas solicita um olhar artístico para dele receber uma mais-valia. As escolhas de Augusto Alves da Silva ( ist, Uma Cidade Assim ou CNB 2001, entre outras) têm sido rigorosas a este respeito. O condicionamento da encomenda, permitiu-lhe trabalhar no limiar da respectiva superação, no desvio. Seria eventualmente possível interrogarmo-nos se à aceitação de encomendas específicas, para além das condicionantes da relação contratual implícita, não subjaz um prazer de trabalhar nos limites de um tema, área ou conceito, promovendo um território de intervenção entre o que foi proposto e o que de todo o ultrapassa, ou seja, uma procura obstinada da permeabilidade das fronteiras. A hibridez do mundo contemporâneo torna-se assim susceptível de objectivação construída pelas determinações dos enquadramentos de Augusto Alves da Silva.
Pedro Lapa
Director do Museu do Chiado