Biografia
Hein Semke nasceu em Hamburgo a 25 de Junho de 1899 e morreu em Lisboa no dia 5 de Agosto de 1995. Radicou-se em Lisboa desde 1932, mais precisamente no arrabalde campestre de Linda-a-Pastora, e participou activamente na vida cultural da capital portuguesa, a partir do seu centro mais cosmopolita, o Chiado.
Daí que os seus companheiros tenham sido, com encontros na Brasileira ao longo das décadas de 1930 e 1940, personalidades como Almada Negreiros, Sarah Afonso, Mário Eloy, Luís de Montalvor, João Gaspar Simões, Jorge Segurado, Diogo de Macedo, Abel Manta, António Ferro, o casal Arpad e Vieira da Silva, Manuel Mendes, Mário Chicó ou Aquilino Ribeiro.
Com passagem pela Academia de Belas Artes de Hamburgo , entre 1930 e 1931, aí estuda Escultura, disciplina com que fará as suas primeiras apresentações públicas em Lisboa, logo em 1933, em contextos historicamente tão significativos como o da Galeria UP, dirigida por António Pedro, e, em 1936, juntamente com John Barber, na galeria SPN, recém criada sala de exposições do Estado Novo sob a orientação rigorosa de António Ferro.
Significativo é também o facto de ter integrado a imensa equipa de arquitectos e artistas que, em 1940, ergueram a grande Exposição do Mundo Português.
A década de 1940, preenchida pelo trabalho de escultura e com uma maior atenção à Cerâmica, foi marcada pela presença constante nas exposições de Arte Moderna do SNI, e terminou com a mudança de Hein Semke de Linda-a -Pastora para Lisboa, alugando um atelier que seria também residência na praça António Sardinha, à Penha de França.
Em 1951 e 1953 integra a 1ª e a 2 ª Bienal de Arte Moderna de S. Paulo, tornando-se predominante, durante esta década, a prática da Cerâmica, apresentada nas importantes exposições de Cerâmica Moderna do SNI, ali nas salas do Palácio Foz aos Restauradores.
Corre a par uma intensa produção de pinturas sobre papel, e presenças nos espaços que vão renovando a circulação da Arte Moderna em Portugal, como a Galeria Alvarez no Porto, em 1957, a Galeria Diário de Notícias, mesmo no coração do Chiado, em 1958, e participa na 1ª e 2ª Exposições de Artes Plásticas da Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa, nos anos de 1957 e 1958, afirmativas presenças colectivas da modernidade artística entre nós.
A década de 1960, obriga-o à suspensão da prática da Cerâmica por razões de saúde, facto que não impede de encontrar novas formas para a sua criação, através das produção de imensas xilogravuras e monotipias, e prosseguindo a invenção de grandes livros, densos tanto na escrita como na profusão da imagem, iniciada em 1958 com o livro Em cada criatura nasce uma flor , depois o Livro de Karin , em 1965, o Livro de Dorle , em 1967, ano em que conhece a companheira do resto da vida, Teresa Balté, prosseguindo com outros títulos tão expressivos como Paisagem interior , de 1970, Apocalipse à Portuguesa , de 1975, o Livro sem Palavras de 1979 e, concluindo já com o livro O cometa Halley de 1986.
A pintura sobre tábua e a construção de objectos escultóricos antropomórficas desenvolve-se a partir de meados da década de 1960, permanecendo contudo a pintura sobre papel o seu meio de expressão mais continuado até 1995, ano da sua morte em Lisboa, data sobre o qual está a cumprir-se uma década.
À sua obra foi consagrada a exposição antológica Hein Semke, 40 anos de actividade em Portugal , realizada na sede da Fundação Calouste Gulbenkian em Lisboa, 1972, e visões parcelares como a da Obra Cerâmica no Museu Nacional do Azulejo, em 1991, e, postumamente Hein Semke. Esculturas no Museu de José Malhoa nas Caldas da Rainha, em 1997.
É todo este percurso pessoal, a par da efectiva importância das suas poéticas no contexto da arte portuguesa, que leva a propor esta visita a Hein Semke, dez anos depois , através desta exposição disseminada que, de facto, é composta por quatro apresentações breves das disciplinas e temas centrais da prática artística do autor, apresentados desde 2 de Junho no Museu do Chiado/ Museu Nacional de Arte Contemporânea e, a partir de 25 de Junho próximo, na Fundação Arpad e Vieira da Silva, na Biblioteca Nacional e no Museu Nacional do Azulejo.
Esta estratégia de disseminação da exposição por diferentes espaços de Lisboa, obrigando o visitante a percorrer os lugares da cidade com responsabilidades na produção e divulgação dos patrimónios culturais, parece corresponder à personalidade e à biografia de Hein Semke, também ele dividido por diversas áreas de expressão, atravessando afirmativamente importantes momentos da vida artística portuguesa, aí integrando e dando a conhecer a sua sensibilidade forte de alemão no país solar que escolheu para construir a sua existência.
Este emigrante cultural como se poderia classificar nas décadas da sua mais activa permanência em Lisboa, foi o que hoje chamaríamos de legítimo cidadão da Europa.
Neste contexto, a prática artística de Hein Semke foi também exemplar, aí inscrevendo na serenidade do modernismo em Portugal um expressionismo lírico e anti amável, oriundo de violentas convicções místicas, poderosos posicionamentos éticos e sociais, assumindo a actividade artística como estrutura primeira da sua vida, em diluição com o próprio acto de viver.
Para além desta atitude que configura de imediato uma postura estética, a sua obra deixou no panorama artístico português um brutalismo ingenuista, o impulso do que há a dizer sobrepondo-se às elegâncias formais de como é dito, aproximando por aí de vias abstractas informais bem contemporâneas.
Daí que seja necessário, senão mesmo urgente, voltar a olhar para as obras deste artista singular, passados dez anos sobre o seu desaparecimento.
Cumprem-se em 2005 dez anos sobre o desaparecimento do artista plástico Hein Semke, nascido em Hamburgo a 25 de Junho de 1899 e falecido em Lisboa a 5 de Agosto de 1995, cidade onde se fixou desde 1932.
Presente nas mais importantes manifestações do Modernismo em Portugal, a sua obra inscreve no panorama artístico nacional uma poderosa e singular marca expressionista, transmitindo valores místicos panteístas mas também de uma religiosidade cristã que nos mostram a dualidade estrutural do indivíduo e a imensa vontade de uma melhor construção do social.
Com uma produção inicial centrada na Escultura, Hein Semke inscreveu o seu pensamento artístico numa fusão criativa que escolhe indiferentemente as mais diferentes disciplinas, o Desenho, a Cerâmica, a Gravura, a Aguarela e a Pintura, atitude que revela a integralidade do ser realizada na pluralidade expressiva.
Representado em numerosas colecções particulares em Portugal e no estrangeiro, principalmente na Alemanha, a obra de Hein Semke está presente nas colecções do Museu do Chiado - Museu Nacional de Arte Contemporânea, Centro de Arte Moderna José de Azeredo Perdigão - Fundação Calouste Gulbenkian, Museu Nacional do Azulejo, todos em Lisboa, e no Museu de José Malhoa nas Caldas da Rainha.
Entende-se que a personalidade e a obra multifacetada deste autor não deveriam ser esquecidas nestes 10 anos que passam agora, em 2005, sobre a sua morte.
Assim ponderou-se um projecto de exposição disseminada por diferentes instituições, estratégia que permite, por um lado, produzir acontecimentos com mínimos encargos financeiros e humanos para cada uma das instituições, e por outro, repõe a inquietação estrutural de Hein Semke por mostrar ao público as diferentes disciplinas em que se expressou.
Deste modo, propõe-se expor cerca de dez peças de cada disciplina em diferentes instituições em Lisboa, o conjunto das exposições servido por um catálogo comum, e que convidaria o público a circular entre diferentes espaços em itinerários que teriam a obra de Hein Semke como direcção, gerando não só um conhecimento alargado da obra do autor como a articulação entre diferentes espaços da cidade.
Paulo Henriques
Lisboa, 1 de Junho de 2005