Estas duas imagens inscrevem-se num percurso auto referencial e seriado com que o artista tem abordado a multiplicidade significante do rosto. Nesta série, em particular, o artista reporta-se à desilusão do Papa Inocêncio X, que perante o seu retrato, pintado por Velásquez, terá afirmado que este era Troppo Vero. A série, T.V. elabora uma reflexão obsessiva e irónica com a vertente realista e verista da fotografia, tão intrinsecamente ligada à representacção da identidade na época moderna, e um dos muitos paradoxos da ontologia fotográfica. O dispositivo formal do grande plano permite ao artista elaborar aproximações epidérmicas, transformando a sua imagem numa derivacção plástica, num rosto que se expressa para além do seu estatuto natural e verista. Tal como em muitos outros trabalhos, a imagem não serve de reconhecimento mas elucida e ilude sobre a vocacção primordial entre fotografia e tempo. Nestes retratos, a escuridão que lhes serve de pano de fundo acentua a complexidade da representacção, instaurando uma expressão de subtilezas, ínfimas parcelas de um percurso tão vasto quanto o mistério da identidade.

Emília Tavares